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Nós árvores
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Nós árvores vivemos de chuva
de orvalhos eternos e das neblinas
dos rios e dos oceanos
de vapores matutinos
e delicadas névoas.
Durante o dia o calor
dos raios do sol
dilata os nossos corpos sublunares
que absorvem assim, no profundo
delicadissimo orvalho no turno.
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O ritmo da água
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No interior, em feliz morada
cantam pequenos pássaros no verão
Não pedem, atenção, mas escuto os lamentos
o ritmo ardente da água cristalina
envolve o seu respiro, o rosto de menina.
Cantem vocês, Caá-mata, Porá-morador,
Caí-queimado e Pyr-corpo tostado
homem do mato, direção interior
pequeno indígena, fumando doido
cabeleira hirta, cavalgando caititu
e o segue o cachorro papa-mel, pé moreno
rosto redondo, livre,
agitando um ramo de japecanga,
pé de garra, pé só, torto, enraivecido.
Hoje tudo toma uma nova forma
silêncios inadvertidos, sonolentos
estás aqui, mais uma vez, e não è norma
suas asas a bulir e sem intentos
pássaros percorrem em distância viagens
países, e o seu voar volteia áspero
pousou e fez seus ninhos, nas passagens
atravessa terras, sem árvores, austero.
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Ilha de Marajó
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As mulheres ondulando num mar de folhas
se escondem, fogem, leves, dançam
em honra ao sol, uma dança cômica
imitam macacos, assanhadas suspiram
a mão esquerda pendente,
a direita sobre as costas riem.
Três curumins carregam cestos
cheios de muricí e açaí. Dois passos
e ao segundo passo, na ponta dos pés.
O riso das mulheres, o riso das crianças
os rostos aparecem, desaparecem. A dança reinicia
outras vozes: sons de outros animais, água
ramos se quebram. As músicas, instrumento lentos.
Kupaúba abraçada ao boto seguia
na onda do rio o fluxo da corrente ao mar.
Marajó espaços de sol ardente, retorno
estrelas serpentinas, marombas, carapanãs
retorno sempre a lugares remotos, embriaga
o cauim devagarinho, sem fazer mal
viscosa, insípida, resvala na garganta
é dourada a bananeira, mamoeiros
vozes de Marajó, queixas, cochila
parvos gritos de Cacauê, mas onde quer andar
Kupaúba atravessou cinco rios, caminhou
cinco luas, e mil pequenas veredas
para chegar a Marajó, e ver o mar.
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O parto da floresta
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Do corpo retorcido, do centro das coxas
das vísceras, entre folhas perto do rio
entre o sangue e os cheiros do mato
que envolvem seu corpo:
com a ajuda das mulheres da aldeia
a galáxia da floresta escuta seu vagido
entre os braços Kupaúba-árvore.
A barriga e as pernas reintegram os cheiros
das flores, de folhas, frutos, seu ninho
é um continente, esse corpo pequeno
pulsando, o sol clareia o mato e o rio
"quanto tempo passou" o pajé indaga
"a quem pertenceu sua alma?".
As danças se prolongam até o anoitecer,
os ventos passam leves e uma voz sussurrante
louva Tupã e anuncia: Kupaúba nasceu.
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Todos os rios da terra
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I
Levam os jamaxins com as mandiocas, as mulheres,
seus pés afloram às margens do rio.
Kuambu vê passar Kupahúba
e um rio imaginário lhe percorre
a mente: é uma corrente que atrai
para si todos os rios da terra.
A pele ardia, fecha os olhos,
o sol caricias silenciosas sobre o corpo
de Kupahúba, tocando seus pequenos seios.
É ainda muito jovem Kupahúba e ele
deverá esperar o seu ritual de iniciação
amorosa. Com a mente viaja
entre o ar e as nuvens. Ontem sonhou
um dente que voava e um odor desconhecido.
Na praça com as outras Kupahúba se prepara
para ser iniciada. Por três meses
ele não a verá. Tudo roda, roda.
Ela chega perto dele e ele sorri.
Dentro do seu corpo uma força devora
as águas dos rios e das lagoas.
É ele Mboi-Guaçú que com mil olhos
que a envolverá e abraçará Kupahúba
mas o amor atenuará a força
“Mboi-Guaçú vai embora” implora Kupahúba
II
Os maracás e as flautas começam a tocar
de inicio o ritmo é lento, depois frenético.
Kuambu pensa na profecia: “Kupahúba
será amada pelo mito” quer soltar um grito
mas nenhum som lhe chega à garganta.
De manhã tudo começou
o tempo já denunciava chuva.
Do cajueiro com seus frutos cheirosos
pendiam na humidade densa e quente:
Kupahúba atrai Mboi-Guaçú,
serpente arco-íris, com seu encanto.
Ele fará ofertas à divindade jaguar
-para manter sempre vivo nela
o fogo do seu desejo
e macia a sua pele.
Comidas e oferendas de flores no ritual
Brilhantes os mil olhos de Mboi-Guaçú
Tons de azul turquesa e amarelos
iluminam os abraços.
Este é um fogo que quer prosseguir
substancia sexual do sol
que penetra
as bagas perfumadas de araticum
e com o seu perfume
seu corpo é mais sedutor.
“Traz-me com os meus mil olhos entre as estrelas
para que um outro guerreiro, um deus terreno,
não possa olha-la”pede Mboi-Guaçú e inicia
seu caminho longo o corpo de Kupahúba
III
Kupahúba pensava de sonhar
nem se despediu da pintassilga
nem da saracura. Todos conhecem
a devastação que à sua passagem
Mboi-Guaçú deixa em uma aldeia.
Sem piedade o tempo escorre no corpo
das plantas e dos animais,
Mboi-Guaçú perdeu as suas cores acesas,
permanece somente o brilho dos olhos
sob o luar.
Balançado pelo vento o murici
sacode os frutos dos ramos.
Aflitos os pequenos animais que habitam
as arvores vivem o tumulto.
Agora o canto cresce sempre mais
os maracás dos pajés entoam evocações.
O sol da manhã se insinua com seus raios
o canto dos pássaros o acompanha
os gritos dos animais. E a floresta
respira aliviada.
Mboi-Guaçú desapareceu.
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Terra onde não se morre
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A Terra onde não se morre
em marcha o povo ameríndio
evocam Tupi e os outros deuses
e aos sons do boré, foge sua voz
os filhos de Jaguar, flexíveis
da costa dos mares, em direção Norte.
No Brasil eram três milhões
os índios Caetés e Tupinambas
fugiram para o Maranhão e Pará
atravessaram todo o território
pararam às margens do rio.
São os Tapirapés em movimento
de olhos abertos, arquejam
exaustos chegam ao rio Araguaia
penetram a Floresta, se retiram.
Plumas amarelas, marrons, folhas vermelhas
O jacaré, a juçurana, o a lontra
as árvores gigantes são milhares
como são milhões em marcha o povo ameríndio
filhos de Jaguar, flexíveis
atravessam o território, sem parar
da costa dos mares, em direção Norte
de olhos abertos, guerreiros arquejam
chegam exaustos, são os Tapirapés
penetram a floresta, aglomerados
em direção à ‘Terra onde não se morre’.
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Os Indios renascem
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Nas margens do rio, as canoas
as ondas em espumas,
teu riso aberto quando todos entram, inicia o caminho
tortuoso dos mortos e vivos, as saudações
memórias, primeiras cantigas
Kupaúba perdeu a cabeça
chorava, chorava, chorava
a sua aldeia estava destruída
as palavras se derramam em seus ombros
seu olhar, não tinha ódio
devia reiniciar, sozinha
eu os amo, pensava
e era tão enérgico seu olhar
que os crocodilos ofereciam suas costas
como se fossem cachorros
e os jaguares, roçavam suas pernas
como gatos domésticos.
Eu os amo, repetia.
Os índios mortos, brotam
culturas submersas, por séculos
dentro da terra árida
as tribos sementes renascem
com a chuva, milhares de flores:
o deserto torna a florescer.
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Holocausto das árvores
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Jerimum o Sol que nasce
inchando o vermelho no céu
Floresta cheia de cores
roendo as entranhas da terra
com suas raízes vivas
Kupahúba tem raízes
Não vai encontro ao vento:
è o vento que a abraça
trás o cheiro do bacuri, fruto carnoso,
do capuaçu, polpa aromatica
de pitanga, de murici...
No céu vermelho alaranjado
o silencio obscura a luz
Kupahúba vê um rio derramar-se
brotando da casa do sol
O vento traz luz resplandecente
e fumo negro e calor incandescente
e penetra entre as arvores
as folhas ardem movendo-se
no meio da desordem da floresta
entre o caos e a fumaça.
Tudo é fogo... as arvores caem... tudo è cinza:
Neste ritmo frenético também o céu cairá.
O extermínio não pára:
Kupahúba espera
sente o fogo correndo em seus ramos
seu corpo verde treme e sente a dor,
ela que alivia a dor sente
o fogo gemer em seu tronco
perpassar suas raízes
e a terra morta da floresta devastada,
escombros...
O holocausto de uma multidão de arvores.
O vento não trás musicalidades conhecidas
perturbações de verde e azul
retornem retornem ritmos antigos
1998
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